sábado, 14 de março de 2009

Experiência #009

["... São as águas de março fechando o verão/ É promessa de vida no teu coração..."


Sábado, agora, 19h. Hoje, pela manhã, começou a nova turma da Formação em ACP (coordenada por mim e pela Ticiana Paiva, com participação docente do Prof. Cavalcante Jr).



A Tici é uma parceira especial, de vários outros encontros na vida, ela é também Psicóloga, Humanista e Pragmatista, e temos uma capacidade singular de nos influenciarmos mutuamente, em vários aspectos. Para nossa fortuna, desde a nossa própria Formação, conseguimos trabalhar, pensar e sentir, juntos, de uma maneira interessante. Eu, Tici, Yuri, Paulo, Bruno, Ângela, Lúcia, Silvinha, e, agora, Renan, Léo, Dondon Feitosa e outros, fazemos parte de um mesmo movimento, ou Escola de ACP com raízes Experiencial-Organísmica e Pragmatista. Em comum, fômos todos estudantes na Universidade de Fortaleza e formados pelo Prof. Cavalcante Jr, fizemos Formação específica em ACP sob o referencial das Três Tendências, participamos de grupos de estudo e grupos de pesquisa de base am ACP e na Teoria Experiencial, além de realizarmos diversas incursões intelectuais e vivencias nesse mesmo campo.


Incrível, para mim, retomar os fluxos que originam o Humanismo em Psicologia. É uma viagem muito intensa, que me atravessa como em se tratando de uma peregrinação aos lugares importantes da alma. A possibilidade de estabelecer novos laços, de ser atravessado por novas questões, novos horizontes, novas dúvidas, novas problematizações, novas limitações... Pois é, a limitação, a restrição, ela, também, é algo sempre novo, sempre superável, sempre bem-vinda. A “limitação”, assim como a eternidade do ilimitável, do infinito, trazem, sempre, novos ares de criação, de ampliação, de descobertas, de crescimentos. É interessantíssimo adentrar novos espaços de relacionabilidades e construções. Passei a semana, inteira, com saudades do blog, com necessidade de escritas e partilhas, mas acho que, no meu Organismo, os movimentos ainda buscavam digerir os efeitos inúmeros do viver e do existir. Então, a verdade é que eu não consegui encontrar um lugar, dentro de mim, para escrever... não faltaram reflexões e direções, mas a escrita ainda estava fraca, relutante, vulnerável demais... ou melhor, ela ainda estava sendo “in-scrita” no meu corpo, e, talvez, apenas agora, ela possa ser “e-scrita” no papel. Renan, por exemplo, perguntou-me, hoje, porque eu escrevo em um caderno com linhas de partituras, um caderno de músico... eu mesmo não havia interrogado-me a esse respeito, e, muito menos, deixei simplesmente passar por mim essa vivência, muito simbólica, de que, no Curso de Formação, meu caderno é de música. Quando recebi a marca experiencial embutida na pergunta, levou algum tempo para ocorrer-me que não há nada de errado, e nada de especial com o caderno – para mim, é tão óbvio, que é estranho considerar a pergunta como algo a ser estranhado. É óbvio, na medida em que, as letras, para mim, são apenas partituras.


Quer dizer, a maneira como eu escrevo utilizando-me de palavras não se distingue da maneira como eu escrevo utilizando-me de notas musicais. Na minha experiência, são apenas códigos-fonte, são apenas símbolos e suportes para mediação da eternidade. Uma nota das escalas, uma letra do alfabeto, são o quê, ademais, se não, apenas, um som? Uma tentativa de registro do som? Um conjunto de símbolos/notas musicais aludem uma dada possibilidade de vivência e uma aprendizagem em potencial, a partir da relação entre a produção do autor/compositor e a interação do mesmo com a história de vida do receptor/usuário, tanto quanto um conjunto de símbolos/letras fonéticas aludem uma dada possibilidade de vivência e uma aprendizagem em potencial. Escrever, com notas ou com palavras, são tentativas, diferentes, de valer-se do Poder para estabelecer uma forma de comunicação. (Interessantíssimo! A fotografia, por exemplo, como me ensinou o B. Aboim, é uma escrita com a luz...) Em outras palavras, nesse mundo das interações, mediações e sociabilidades, é através do Poder com o qual, por um lado, alguém busca alcançar e influenciar/modificar o campo experiencial do outro, somado à exigência de que esse outro reconheça e aquiesça esse canal de interação. Minha escrita, portanto, seja uma escrita no papel, seja uma escrita no silêncio (fala), seja uma escrita no espaço (dança, movimento), são convergências para modificar algo, uma tentativa de alcançar a realidade terceira, de modificá-la e modificar a mim própria nessa construção, nessa relação decorrente da interação. Não é, portanto, razão de surpresa para mim, a lembrança, mais ou menos recorrente, de que as letras (as teorias, por conseguinte...) são apenas registros musicais. Elas só virão a impor-se sobre mim, sobre a minha realidade, na medida em que meu Organismo aquiesça. Se ele não legitima, não reconheça, pode existir teoria que for, podem falar o que quiserem, podem mover-se da maneira como queiram, meu Organismo segue em seu funcionamento com outras pontes, relações, registros. A fala, a escrita, os sons (os sonhos), são apenas partituras – que não fazem sentido algum, posto que estão mortas, até que eu as recolha, e execute-as no meu dedilhar existencial, preferencialmente de uma maneira tão íntima, tão radical, tão própria, como quem interpreta uma valsa clássica em pianíssimo. Então, e somente então, o que era código, letra, nota, fria e morta, ganha vida, na medida em que adentra os fluxos de vida na minha Organicidade. Por outro lado, o processo da escrita, da composição e comunicação do sentido, como o faço agora, no exercício de simbolizar as matizes do silêncio, de localizar-me em um percurso dado de territorialidades, rupturas e movimentos, isso também é muito vivo. Não que o uso da letra e do código e da nota musical sejam reféns da morte. Não. Enquanto escrevo, na verdade, enquanto estou vivo, há vida. Que parece que é cessada, no texto-partitura, quando me ausento, me distancio do mesmo, e carrego, comigo mesmo, os fluxos vitais limitados que habitam meu Organismo. Quando se vão os fluxos, comigo e para longe do texto, a sensação como se o livro repousasse, feito criatura que hiberna à espera do próximo alimento, guardado e protegido dentro de uma câmara, de um sarcófago, à espera de sangue novo de cuja circulação proporcione-o (ao texto) uma nova experiência de vida. Parece-me que é também disso que estou buscando ao escrever, ao tentar escrever, agora, sábado a noite. Tentando escrever, para registrar, lapidar, uma nova estrutura, um novo campo – eu diria, uma nova “sonata vital”, uma nova “valsa existencial”... que, mesmo sabendo, irá adormecer por dias e dias frios, distante e esquecida, até que algo vivo novamente a alimente, como eu a alimentei outrora... mesmo sabendo que, eventualmente, essa sonata ou vital, criada no lastro do amor e dos registros vitais que me ocorreram, criada, ela mesma, de uma das minhas costelas, parte da minha carne, emprestada das minhas horas, da minha energia, dos meus nutrientes, dos meus líquidos sutis, da minha aura... mesmo sabendo que, uma vez criada, e repousante por muito tempo, poderá vir a ser encontrada, resgatada, reencantada, poderá, ainda, sucumbir e desaparecer para sempre, para mim sobretudo, e sua energia restituída à Gaia – ela mesma, Gaia, parceira da vida, e maior credora da minha Organicidade. Pois bem, como quem vai parir uma nova expressão da vida, surge um texto, um registro, mediado por um código específico por mim selecionado (letras, notas musicais, linhas de tricô, tintas etc), e na constituição desse texto, estou, eu e o texto, vivos, movimentantes, circudantes de vida e de orbitais, de relações, de conexões, de alianças, de teias de ressonâncias... A experiência acontece, e, novamente, seu campo de ressonâncias é aberto, e algo de novo surge... e o registro da escrita, longe de ser inútil, é, ele mesmo, um projeto e expressão da criação, da manifestação e diferenciação de novas estruturas do viver, de novos trajetos e jornadas a serem realizadas. Eu escrevo como quem oferece parte do sangue, parte da água e parte da própria comida, do próprio corpo, para que um caminho, específico, também esteja oferecido e contemplado. Escrevo para compartilhar mais vida, para viver mais em mim e proporcionar mais vida e movimento alhures.]


Três experiências muito interessantes, provocativas, de ontem para hoje: a aula sobre as Três Tendências, à convite da Ticiana, na Universidade. A palestra, ontem a noite, na série “Humanismo nos Tempos de Hoje”, na Livraria. E, hoje pela manhã, eu diria o “workshop” conceitual sobre as premissas, postulados, culturas e vivências na base do Humanismo. E tantas outras potencializações expressas nas interlocuções... por exemplo, Tici, Hélton e Léo estavam na sala-de-aula e na palestra, Renan e Márcia estavam na palestra e no workshop de hoje. A Karine estava na sala, na palestra e workshop de hoje. Então, existe, em mim, e, de alguma maneira, também para eles, uma sensação de construção, de percurso... Foi muito bacana sentar e preparar uma aula universitária, na melhor acepção do didatismo universitário (que é diferente de fazer uma palestra aberta), sobre as Três Tendência. Foi muito (muito!) bom para mim ter essa experiência, que, me parece, experiência madura/consolidada e “redondinha”, lapidada, de apresentar algo, a um só tempo, de forma COMPLEXA e CLARA. Não apenas claro, sendo dietético, insosso e insipiente, não apenas complexo, sendo confuso e problemático. O fato dessa equação (complexidade e clareza) oportunizar maior compreensão pelas pessoas, permitiu-me usufruir um SIGNIFICADO, de um brilho diferente... ainda não sei precisar, localizar fronteiras, atribuir contorno. Eu gostaria que a tecnologia já fosse capaz de me ajudar, transcrevendo algumas falas, e disponibilizando-as aqui... não tenho, ainda, ferramentas, de maneira que há como escrever tudo. Vou, apenas, mencionar os marcos, referentes às distinções experienciais para cada uma das três Tendências:

* T. AutoRegulação: diz respeito a movimentos experienciais (circunstancialmente) não disponíveis ao Self, mas (potencialmente) acessíveis ao Organismo;

* T. Atualizante: diz respeito a movimentos experienciais (potencialmente) disponíveis ao Self, mas (circunstancialmente) inacessíveis ao Organismo;

* T. Formativa: diz respeito a movimentos improváveis, inalcançáveis, absurdos ao Self, mas passíveis de serem experienciados pelo Organismo;


Dessa matriz, desdobram-se compreensões e intervenções (por exemplo, quadros de incongruência, analisados a partir de combinações, fatores e interações das Tendências).

As palestras, mensais, na Livraria Acadêmica, estão, para mim de modo particular, representando uma oportunidade de costurar e debater intervenções públicas, de realizar uma dimensão muito importante do Humanismo-Pragmatista que é a da transformação e mobilização social (afinal, não é um Humanismo Racionalista-Abstrato, não é um Humanismo-Empírico, Sensível), em uma experiência do social que não se limita aos muros e relações sociais estritamente acadêmicas. É complicado de imaginar que possam, eventualmente, existirem Pragmatistas meramente acadêmicos – na verdade, são scholars, eruditos, intelectuais do Pragmatismo, mas não são ativistas sob um referencial Pragmatista. (O Pragmatismo Americano, desde Peirce, James, Dewey, Rorty está encharcado por uma militância constante e irrefutável a favor da liberdade de crença e de consciência, afinal, liberdade e mobilidade experiencial, estando, portanto, nas ruas e nas praças, nos debates e nas contestações). Talvez, não sem razão, observo que o pano de fundo da Política e do Poder, das Instituições e do Estado, adentrou a discussão, de maneira tão enfática... acredito, por extensão da mesma justificativa, que a minha própria prática, interface e interlocução com a Psicologia do Trabalho, esteja inserida nesse esforço consciente de participar de um número maior das dimensões constitutivas da pessoa, através da Psicoterapia, da Psicologia do Trabalho, da Formação e debates em ambos os campos, das Contestações e Argüições Sociais acerca da vida comum na Pólis. Certamente, Humanista & Pragmatista. Essa junção já me faz muito sentido, pessoalmente à minha escrita, às minhas reflexões e sentimentos, contudo, ouvi-la, emprestada, por exemplo, ao modo com o qual Karine apresentou-me, na última noite, parece ganhar uma borda de ainda maior confirmação, responsabilidade e legitimidade. Psicologia é minha ciência, minha técnica, meu olhar. Minha constituição é como Homem das Letras, como Humanista e como Pragmatista. E decorrente dessas três últimas influências, ainda que, hipoteticamente, não houvesse um campo específico de intervenção do tipo psicológico, ainda assim, eu expressaria minha ética das Letras/Humanidades, do Humanismo e do Pragmatismo com outras formas... Além disso tudo, que, absolutamente, não é pouco para mim, existem as pessoas concretas, seus olhares, suas expressões, suas posições, suas questões, suas observações... existe o debate, a troca.


Saímos da Palestra, e fomos, Silvinha, Léo, Paulo, Yuri, Renan, Cavalcante e eu, jantar no Natural & Leve. A conversa-jantar começou às 22h, e eu cheguei em casa 1h30. Falamos sobre várias coisas, e, novamente, o interesse das pessoas pelo SecondLife canalizou as reflexões em torno das confluências entre Second e First Life, entre o alcance e influência dos registros de um no outro, mutuamente... ótima, ótima conversa. Apenas coincidência? Essa semana, a capa da revista Época, uma revista de circulação nacional, é sobre uma ferramenta virtual chamada Twitter, que se define como um telégrafo virtual. É uma nova forma de estabelecer convivência, de construir redes e partilhas... Confesso que estou interessadíssimo em aprender mais sobre tudo isso, por exemplo, já tenho Orkut, que é uma ferramenta popular no Brasil, e, recentemente, me cadastrei no FaceBook, que é o correspondente ao Orkut, com maior aceitação fora do Brasil – como ainda não tenho “amigos” no FaceBook, não tive a oportunidade de explorá-lo razoavelmente. Ademais, há o e-mail (que, semana passada, no jornal, segundo uma pesquisa realizada, tornou-se uma ferramenta desatualizada para os jovens atualmente, tornando-se, ao contrário, o recurso preferido por instituições – confesso, também, que tenho que pensar mais sobre o que significa a adesão das instituições aos e-mails, significa, talvez, que o e-mail é uma ferramenta que pode, mais facilmente, satisfazer as exigências e manutenção dos fluxos burocráticos?). No jornal de hoje, sábado, há uma matéria sobre a revolução causada desde 1989, com a criação da World Wide Web... da possibilidade de se construir uma Inter-Net. Estou meio chocado! Como é que a Internet tem, apenas, 20 anos? Uau. Algo tão, tão novo, e, em tão pouco tempo, mudou a forma com a qual entendemos a realidade?


Imagine, apenas, que um executivo, com o seu celular do tipo BlackBerry, recebe e responde e-mails, direto do seu bolso, no caminho do carro, durante uma reunião, dentro do banheiro, recebe mensagens de aviso da sua conta particular do banco, tem acesso à rádio e televisão... tudo isso, com base em serviços da virtualidade. 20 anos, apenas!? Minha gente, estamos, realmente, compreendendo o que é mesmo que acontece, nessa Era Pró-Tecnologias, Pós-Epistemologias, Pós-Ideologias? Realmente estamos congruentes para suportar, acessar, significar e experienciar a revolução que está acontecendo? Minha mãe, uma distinta e esclarecida senhora de 56 anos, apenas nesse ano, resolveu aprender “informática”, em um curso para senhoras de idade. Ela está adorando, o professor, as colegas e os recursos da tecnologia. Minha mãe me disse que jamais aprenderia qualquer coisa com o computador se não fosse a motivação pessoal do abandono precoce dos filhos, meus dois outros irmãos, que saíram de casa muito cedo, para residir em Salvador e Cuiabá. (Eu mesmo estou fora de casa desde os 17, ou seja, fazem 10 anos.) Dada a situação de distância e acesso limitado pelo telefone, que é caro, e as viagens, não tão acessíveis à freqüência dos cuidados e desejos maternos, minha mãe decidiu, voluntariamente, procurar o curso para aprender, número um, a pegar no mouse. Veja, para minha mãe (e outras mulheres da geração dela), se quer existe motricidade final, suficientemente lapidada, para tocar e reconhecer o funcionamento sensível do mouse, que dizer, então, de entender o que são janelas, aplicativos, sistemas operacionais. O fato é que minha mãe já estão nos módulos avançados (talvez, esteja há um ano no curso), e já sabe mandar e-mails, para mim, para meus irmãos. Duas vezes por semana, senta, diante do MSN, e conversa, em um dia, com meu irmão (utilizando teclado), e, pelo SKYPE, em outro dia, com minha irmã (utilizando câmera e microfone). Outro dia, recebi um e-mail dela, em uma das manifestações maternas recorrentes de afeto e amorosidade – por e-mail, certo? Minha mãe, também acessou o meu blog, e me comentou, por telefone – por telefone, certo?, que o meu blog é muito complicado... Gente, vocês REALMENTE estão compreendendo o quanto da nossa experiência já é um processo, ou um fluxo de processos que transitam por vias de acoplamentos organísmicos com a tecnologia?


Minha mãe, para amar, para cuidar, para sentir-se exercendo o amor e o cuidado, para dar sentido ao lugar dela de maternidade, para manter-se reconhecendo como uma mulher que cuida dos filhos, NÃO precisa me ver, ela me telefona; não precisa me beijar, ela me manda um e-mail com seus beijos. Ela não precisa, se quer, “ver como estou”, basta ela entrar, pelo SKYPE, e, com o microfone e caixas de som, me ouvir, e diagnosticar minha voz, precisar se estou doente, rouco, cansado, triste, com sono... ela me vê pela câmera, e tem a sensação, muito, muito presente, muito real, de que eu continuo fazendo parte da casa dela, vocês realmente entendem a implicação subjetiva disso? Eu não estou em casa, mas graças aos acoplamentos organísmicos, a cabeça do organismo da minha mãe, continua com a sensação de que “estou em casa”, afinal, ela me escuta, ela me vê, ela briga, brinca, ama e cuida de mim, pergunta como estou, fala como ela está... só que não estou com ela, mas, para ela, estou presente. Para ela, eu e meus irmãos estamos presentes. O Presidente dos Estados Unidos, por exemplo, foi o primeiro Presidente americano a utilizar-se, massivamente, de recursos de vídeo na internet, recursos de textos interativos na internet... ele mesmo, utiliza-se de um BlackBerry que já tinha antes e que, mediante a insistência dele em mantê-lo, a Agência de Segurança americana teve que adaptar e proteger o BlackBerry presidencial (que, por exemplo, por exigências jurídicas daquele país, toda mensagem e texto, inclusive e-mails, enviado em nome do Presidente, precisam ser registrados e documentados). O Presidente usa um BlackBerry. Eu, apenas um psicólogo, tenho uma conta de e-mail no Google. Com essa conta, eu tenho acesso a Blogs que estão armazenados no servidor do Google, o meu próprio Blog dentre eles... tenho acesso a e-mails, armazeno informações – em limites vertiginosamente e cada vez mais superiores... da minha conta de e-mail, meus contatos sabem se estou ou não on-line, com a distância de um cliquezinho, podem conversar comigo e trocar informações, afetos, através do GoogleTalk... também graças ao Google, tenho acesso ao YouTube, e posso assistir vídeos, documentários, filmes, palestras, aulas, diversão... eu posso gravar um vídeo e disponibiliza-lo e, eventualmente, se o meu vídeo obter um fluxo recorrente de acessos, recebo, no meu cartão de crédito particular, uma quantidade de dinheiro real referente ao número de acessos ao meu vídeo – todo esse dinheiro custeado pelas propagandas disponíveis na ferramenta de exibição do YouTube. Em uma parceria entre o Google e o Picasa, existe o GooglePhotos, onde posso criar um álbum que protege todas as minhas fotos do amarelamento e, ao mesmo tempo, permite que outros tenham acesso a imagens que estariam no fundo dos meus baús. Tenho, também pelo Google, acesso ao GoogleEarth, que são mapas, precisos, de satélites, com ruas, direções, posições de casas – o telhado da minha casa, e o meu condomínio, pode ser visto pelas lentes do GoogleEarth. Também pelo Google, tenho acesso ao GoogleScholar, um banco de dados de artigos e informações científicas. Não apenas posso ler artigos e comentários científicos, mas alguns livros estão disponíveis para pré-leitura e consulta, virtualmente, sem que me dirija a qualquer biblioteca ou livraria. Caso eu goste do livro, posso comprá-lo na Livraria Virtual, e chega, pelo sedex, em dois dias úteis. Caso seja esgotado, também pela internet, acesso um Sebo Virtual, e em 15 dias corrido, o livro, eventualmente disponível em um pequeno sebo na periferia da cidade de Curibita, chega, pelo correio, até minha casa. Imagine, então, que meu computador, óbvio, com tantos estímulos e processos, começa a ficar lento, fraco, começa a travar... também pela internet, eu posso comprar um novo computador, desktop ou notebook, por exemplo, pelas Lojas Americanas Virtual. Em um procedimento super simples e prático, também pela Internet eu acesso a minha conta de banco, detalhe – isso tudo acontece durante a madrugada. Da minha conta de banco, verificado o meu saldo disponível, faço uma transferência bancária on-line, às duas da manhã, pela internet, e uma semana depois, a televisão nova, ou o computador, chega à minha casa. Graças ao Google, eu tenho acesso ao Orkut, que é uma plataforma de convivências e conveniências, onde eu crio pastas com minhas fotos prediletas, minhas músicas e vídeos, informações pessoais, troco mensagens, cadastro-me em comunidades específicas e, também, construo minha representação, minha comporalidade virtual, dou contornos e imagem à minha vida e presença virtual, criando, no meu Orkut, um BuddyPoke... com o meu Poke personalizado/customizado, e suas roupas, traços de personalidade, estilo e corpo definidos, passo a expressar sentimentos de amor, gratidão, solidão, cansaço, com outros Pokes dos meus amigos... Também pelo Google, tenho acesso a um localizador, uma plataforma de informações, em todas as línguas, em todos os continentes... posso, eventualmente, propor ou participar de um espaço de interesses comuns, através do GoogleGroups... enfim, a minha experiência navega por um horizonte de eternidades simbólicas.


Se, antes, a experiência navegava, apenas, por universos físicos, mediados por interações concretas, já não há, agora mesmo, como dizer que a experiência... por exemplo, a experiência descrita pelo Rogers, que morreu em 1987, a experiência de Tendência Formativa do Rogers, descrita em 1975... quando o Rogers morreu, GENTE: não havia nem Internet! Vocês realmente acham que estamos falando da mesma experiência, dos meus processos, dos mesmos fluxos experienciais? Se, antes, por exemplo, durante o surgimento das Condições Facilitadoras, já tínhamos um processo cultural e contingencial que, muito embora as Seis Condições Permaneçam as mesmas, ainda assim, elas precisam ser ancoradas, significativas, facilitadas e sustentadas em indivíduos concretos, que tem novos corpos, novos funcionamentos, novas estruturas, que fazem parte de culturas e contextos diversos... não obstante essa constatação, que já é absurda e difícil de ser considerada a partir das exigências mínimas, o que dizer, então, que mais basilar do que a sustentação particular das Condições, anterior mesmo a essa preocupação, a própria noção, extensão, alcance, processos e fluxos experienciais, hoje, agora, enquanto escrevo e minha Organicidade participa do mundo, agora mesmo, graças às Tecnologias dos últimos cinquenta anos (rádio, televisão), dos últimos vinte anos (pós-abertura Democrática, 1988), e, mais recentemente, com as Mídias Sociais (Orkut, Twitter, FaceBook, blogs/fotologs/diários, fóruns, páginas pessoais)... minha gente, hoje em dia, é possível cometer um crime virtual, por exemplo, de calúnia, injúria e difamação, um crime de expressão virtual que produz efeitos na vida “real”, efeitos, sanções, multas, ressarcimentos, prisões reais. Através da internet, de fluxos virtuais, as pessoas são julgadas e presas, na vida real? Pela internet, elas compartilham fotos e delitos puníveis na vida real... e, na vida real, em sua sala de casa, não há registro ou vestígio nenhum de alguém foi sexualmente abusado, de que alguém foi assassinado... mas, na internet, nos fluxos e nas experiências virtuais, encontram-se registros que, justificam, no mundo real, uma prisão. Diga-me, se a experiência virtual não fosse real, haveriam efeitos reais, na nossa vida social, a partir de uma utopia, de uma abstração? Ou os efeitos reais são apenas decorrentes de experiências reais e que, portanto, através da internet, a vida real também acontece?


Um hacker, por exemplo, ao realizar uma experiência virtual (que nunca existiu no mundo concreto! Paara a qual não existe memória física, para a qual não existe marca ou lembrança no mundo dos corpos), é passível de sofrer sanções reais. Sua liberdade física, por exemplo, pode ser restringida. Filmes, Fotografias, Músicas, Textos são produzidos, editados e compartilhados pela Internet, com efeitos reais. Casamentos, por exemplo, hoje, migram para o divórcio, ou seja, apresentam-se ao litígio jurídico, com a participação de advogados e magistrados reais, a partir de uma ação virtual, qual seja, a traição de uma das partes, um flerte, um namoro, um relacionamento virtual, às vezes, inclusive, com as provas de registros de conversas (logs) a testemunhar, com fotografias trocadas e com experiências de sexo virtual intercorridas. Garotos, hoje, foram presos no mundo real – informa-me o jornal – por terem realizados uma “ação virtual”, por terem criado virtualmente um trote, ao divulgarem textos pessoais dizendo que iriam repetir uma chacina na Alemanha. Também no mesmo jornal, nas páginas caras e prestigiadas que seguem à manchete, leio uma sessão inteira, tradicionalmente dedicada às análises políticas, onde quatro debatedores, dentre eles um Deputado Federal da República, o Presidente do Tribunal de Contas do Município, o Secretário da Fazenda do Governo do Estado e o Secretário de Finanças do Município (ou seja, não são pessoas quaisquer, certo?) falam sobre a necessidade de construção de “infovias da transparência”, ou seja, de redes de conexão tecnológicas e informatizadas para o exercício do controle social, pelo povo, a partir de computadores gratuitos disponibilizados com acesso à internet, para que as contas públicas, nos seus aspectos de corrupção ou exagero, sejam monitorados pela sociedade. Eles falam de “PORTAIS” com informações sobre legislação, relatórios de acompanhamento fiscal, cartilhas e manuais explicativos, atividades colaborativas – “o portal também serve como instrumento de relacionamento entre a secretaria e os cidadãos”, diz o artigo do Secretário do Município. No artigo do Secretário do Governo do Estado, encontramos referências ao acesso democrático à internet como uma meta pública daqueles que “desejam um melhor desenvolvimento das pessoas nos tempos atuais”, e seguem argumentos, a favor da internet, correlacionando-a à “notícias, conhecimento, entretenimento e comunicação rápida”. Através da internet, demonstrativos de despesas, recursos de “fale conosco”, ouvidoria institucional, relatórios de análises técnicas para gestores são disponibilizados. A internet não está à serviço, apenas, do institucional, do cultural e do entretenimento – ela também é parte do espiritual. No meu altar, real, na sala de casa, tenho uma vela acesa, e, paralelamente, de tempos em tempos, recebo e-mails com pedidos que velas virtuais sejam mantidas acessas, em movimento, circulando entre contas de e-mails e processos virtuais. Existem orações virtuais, serviços de aconselhamento pastoral virtual, existem, inclusive, serviços de altares virtuais – onde você constrói um espaço, virtual, para guardar suas imagens de afeto, devoção e proteção, e, claro, fazer suas orações e acender suas velas. (Eu realmente gostaria de pensar mais se existe, na minha experiência, alguma diferença entre acender a vela “real” e acender a vela virtual... a vela virtual, em sendo parte da minha experiência, não é, por definição, parte da minha realidade? Não se tratam, portanto, de duas velas, de duas experiências, partes mesmas e diferentes da minha realidade?) Outro aspecto de máximo interesse para mim é que a internet não busca, apenas, espelhar a realidade física, ela, também, pode construir uma realidade própria... imagine que ela não permite, apenas, que corpos esculpidos sejam exibidos, em todos seus lances, nuances, ângulos, extremidades e buracos. Não se trata, apenas, de fotografar e retratar a experiência física... na internet, você pode disponibilizar um corpo artificial, que nunca existiu, com aparências, órgãos e desejos que se desdobram em experiências reais, mas que nunca aconteceram, e não podem acontecer – não são reais. Pode criar uma performance, uma interação sexual, por exemplo, entre corpos que não existem no mundo físico. Como é mesmo que podemos entender a experiência real desencadeada pelo surreal ou irreal? Parece-me razoável considerar que, se o Ideal de Eu e as Condições de Valia, categorias incongruentes – e, por vezes, surreais ou irreais – para a realidade Organísmica, ainda assim, são capazes de produzirem efeitos, resta-nos questionar quais fenômenos tecnológicos favorecem ou não experiências de fluxos, para que possamos identificar quais deles são experiências Organísmicas ou não? Uma experiência organísmica virtual!? O surreal ou irreal – e, por conseguinte, o virtual – pode produzir uma experiência organísmica? Ou essa é justamente a fronteira e o critério, tudo que é surreal, irreal e virtual não passa de Ideal e Condições abstratas... Mas, por exemplo, o “Amor”, às vezes surreal, irreal – e, não menos importante – virtual, não necessariamente o Amor é, em si, Congruente ou Incongruente, certo? Existem possibilidades de fluxos e processos organísmicos nessa experiência do amor e do amar.


Eu gostaria de tornar a conversa um pouco mais difícil, acrescentando que, até aqui, tratam-se, sim, de ferramentas interativas, de vias de mão-dupla de trocas e conhecimentos, de realidades virtuais que complementam ações físicas. Mas, o que dizer, então, da ruptura epistêmica inscrita por uma ferramenta denominada SecondLife? O SecondLife não é um ambiente tecnológico de convivência (como, por exemplo, o Orkut). O SecondLife é uma plataforma completa de rotinas virtuais. O SecondLife é um Segundo Mundo, próprio, com rotinas, procedimentos, processos e, até mesmo, dinheiro próprio. Dinheiro, no caso, transnacional – porque se paga e se movimenta em dólares americanos, com uso de cartão de crédito. No SecondLife, eventualmente, pode existir um logaritmo que interaja comigo e que não precisa ser, se quer, humano – e com quem, por exemplo, posso me relacionar, ou me apaixonar. (Eu não sei, ainda, se esse tipo de processo já existe no SecondLife, mas, por exemplo, já tive a oportunidade de conhecer um “FreeBies”... que é uma experiência, por exemplo, que só existe no mundo virtual, sem correlação no mundo físico. “FreeBies”, tecnicamente falando, seria um comportamento autônomo da personalidade... eu diria, um FreeBies é um complexo que toma a personalidade virtual, e expressa-se em um sintoma não cessa até ser substituído pelo usuário do Avatar... eu conheci, por exemplo, um FreeBies de uma dançarina, então, era um comportamento de uma dançarina, em uma Avatar do sexo feminino, de traços muito bonitos e delicados... e ela dançava, sem parar, sem limites! Esse comportamento custou, orçamentariamente a ela, alguns dólares no cartão de crédito, para o incremento da sua personalidade do Avatar. Se é possível criar uma lógica de programação do tipo FreeBies, é possível, imagino, criar um algoritmo inteiro de comportamento modestos, um Avatar inteiro). Eu não preciso de “provas” de realidade física para que processos experienciais ocorram no SecondLife. Dois pontos para concluir: o SecondLife tem um Humanismo próprio, que se chama “Humanismo do SecondLife (SecondLife Humanism)”, transnacional e transcultural, com bandeira própria e sediado em um território virtual chamado de “Jardim de Roma”, a casa do Humanismo do SecondLife. No “Roma Garden”, todos os Domingos, às 14h no Horário do Pacífico, todos os Humanistas se encontram, em torno do Fogo sagrado de Atenas, para discutir o Humanismo. Tais encontros são convocados por anúncios de e-mails. Não tenho condições, agora, de falar mais do SecondLife... mas é um dos meus fortes interesses de estudo e investigação. Eu mesmo tenho pensado, em que medida, podemos falar de um Pragmatismo Virtual, a partir de uma Experiência Virtual? Se o Pragmatismo tem a motivação de influenciar o mundo, não poderia ser também o Mundo Virtual????? Por enquanto, a única hipótese que tenho é que, até o momento, é preciso existirem os usuários físicos humanos para que a interação tecnologia produza-se e tenha efeitos conseqüências. Porém, não acredito que seja impossível, em um futuro vizinho, que a tecnologia produza uma plataforma de interação que não exija, se quer, o reconhecimento e legimitidade humana, que, simplesmente, não seja Poder, mas se torne fluxo direto, fluxo de interação direto. É preciso ter cautela com a internet - a mim, por exemplo, a facilidade com a qual um arquivo pode ser deletado, ou, simplesmente, ser "perdido" em um processo de transmissão virtual (por e-mail), é dos fatos que me causam receio. Estou imaginando, por exemplo, que não temos garantias, como cidadãos, que determinadas informações ou postagens não sejam apenas filtradas ou classificadas, a partir de um interesse específico (por exemplo, o Governo da China proibe os blos de ativistas contrários ao Governo), mas, sobretudo, a perda cultural iminente e diária que um conjunto de informações e registros da espécie e cultura humana desaparecem, diariamente, na Internet. Surgem muitas novas informações, porém, a minha pergunta é: qual o critério para banir, "para sempre", um conhecimento, um texto, um registro produzido, a partir de uma experiência e plataforma virtual? Porque, antigamente, os registros orais eram transmitidos pela tradição e memória, hoje, estão sendo digitalizados... antigamente, livros eram escritos, diários, documentos, hoje, são "pdfs", e-mails, e-books... e o que acontece quando deixamos de pagar uma conta de servidor? O conteúdo inteiro do blog cai no "vazio" virtual, de onde, jamais, poderemos recuperar aquela história!? Uma coisa era queimar todos os livros de uma biblioteca, geralmente, através de expedientes em governos autoritários, estados de exceção... hoje em dia, não precisa de "exceção" nenhuma, porque o caso comum e diário é deletar, apagar, sumir e desaparecer registros e documentos da história e experiência humana virtual. Essa é uma crítica com a qual teremos que nos haver: dependendo dos interesses e ideologias, corremos o risco real de que apenas informações selecionadas persistam, e as outras serão deletadas, como se nunca tivessem existido, e sem a possibilidade de serem reconstituídas ou restauradas, na medida em que abrimos mão dos registros convencionais.


Curtos-circuitos, acho.

Queria alguém para conversar sobre (tudo) isso...


Houve, também, o início da Formação, que foi incrível e muito significativo. Talvez, de uma próxima vez, fale melhor sobre o que construídos na manhã de hoje... Por ora, segue a programação de atividades na Formação, referente ao módulo de teorização que sou responsável. Planejei contemplar, mensalmente, ao longo dos cinco workshops (4h/cada) desse primeiro semestre (Ouvintes são bem-vindos, basta falar com Karine Ivo: cearacp@gmail.com), os seguintes aspectos:

(Wk. 1) “Não estamos presos”

-- Nascimento da Psicologia Humanista, Divisão 34 APA; Humanismo: Arte, Cultura e História; Postulados, Crenças e Convergências – Resistência e AutoDeterminação; Geografias, Renascimentos, Experiência; a Razão, a Norma, a Interioridade, a Psicologia; Instituições, Rupturas, Contextos de aporte aos EUA, ao Brasil;

(Wk. 2) “Podemos crescer”

-- Psicologia Humanista: Epistemologias, Teorias, Conceitos; Novo Mundo, Velho Mundo, Visões de Homem e de Mundo; o Trabalho de Rogers (1925-29/1940/1950) e o Humanismo em Psicologia (anos 60 e 70); Pós-Guerra, Guerra Fria, Guerra do Vietnã, Mudanças, Contra-Cultura, Contestação, Revoluções Sociais, Ecológicas, Espirituais; Humanismo Americano, Filosofia Pragmatista-Experiencial e Filosofias Continentais;

(Wk. 3) Intumescências...

-- Aproximações entre Humanismo de Rogers e de Maslow (Experiência e Realização); Três Tendências no Humanismo de Carl Rogers, Operadores, Critérios/Descritores, Diferenciações, Complementaridades; Aconselhamento e T.Au., Terapia e T.Az., Abordagem e T.Fm;

(Wk. 4) Florescimentos...

-- Uma compreensão de Vida, Movimento Experiencial, Crescimento e Saúde a partir das Três Tendências; Organicidade, Relacionabilidades, Expansões, Interdependências, Teias; Nascer e Morrer dos Fluxos Experienciais sob o Prisma Formativo;

(Wk. 5) Tosas, Podas e Quebras...

-- Três Tendências e a Diversidade no Funcionamento Humano; Potenciais e Bloqueios ao Fluxo Experiencial; As dívidas do Praticalismo/Instrumentalismo/Utilitarismo, do Superficial e do Pressismo (Tempo de Kronos e Tempo de Kairos), do Individualismo e da Rigidez com a Experiência;


(Desculpe mas, falar de experiência e virtualidade, ainda é tão difícil para mim, que fiquei muito cansado e não fiz segunda-leitura ou revisão na postagem. Fica para depois!)

3 comentários:

  1. Poder e modificação do campo experiencial do outro, isso me soa como um ruidinho André. Não gosto dessa palavra Poder, pra mim ela faz parte de uma partitura velha, desgastada, maltratada e abandonada. Lembrei-me que como Humanista Experiencial a escuta na ACP, adentrando o nível superficial dos conteúdos trazidos pelos clientes (superficial no sentido de superfície e não de valor hierárquico, não existe isso na ACP), me permite escutar seus ruídos, suas torções verborrágicas, seus “nós na garganta”, O “engolir seco”, “o engasgado” ou o “sufocado”. Mais do que conteúdos significativos de simbolização de uma experiência, a voz emite sons muito específicos nesse tipo de escuta sensível da qual Rogers estava sempre empaticamente atento. Há um nível de comunicação muito sutil, se pensarmos em termos formativos de organismo humano na comunicação interpessoal. Por trás da fala se pronunciam vibrações das cordas vocais muito profundas que liberam cargas emocionais muito vívidas, muito reais. O que é uma fala pragmaticamente senão um ruído, um timbre, uma canção, de fato? Que som tem seu cliente querido colega? Que música ele toca quando fala? Seu organismo de terapeuta possibilita esse aparato musical se manifestar? São essas algumas das perguntas que venho me fazendo depois do Florescer. E são tantas músicas, tantos sons, tudo tão intensamente humano, vivo, forte (não se perca aqui - ressalto para mim mesmo- pensando que isso é puro empirismo-sensível, estou falando de reverberações, ressonâncias e contatos muito aquém da sensibilidade empírica, embora não a exclua. Mas o foco nessa escuta é uma interação organísmica mais que uma decifração de códigos musicais emocionais)... Particularmente acredito que as escritas não sejam tanto para modificar uma realidade terceira, mas mais pra se integrar a elas, nesse sentido, não faz sentido para mim pensar em Poder (modificação) a partir do campo experiencial, uma vez entendendo esse campo como realinhamento, refinamento, integração. Não estou negando a realidade-Poder enquanto efeito de determinada ação humana, mas na ACP isso não cabe para mim uma vez que se fale de Tendência Formativa como fundamento dessa abordagem. Ainda não compreendo o que você chama de Poder aqui André, dentro de um referencial humanista, pragmático, experiencial e acepista. Queria me localizar dentro de uma experiência tua, é possível? Concordo com a “convergência”, faz mais sentido do que “modificação de realidade” para mim. Acho lindo e preponderantemente incitante à mudança e trans-form-ação sua posição de homem das letras, acadêmico e humanista-pragmatista. Há uma coragem e uma força grandiosa nisso Dré, em mim, compreendo que seria quase impossível eu sustentar esse campo. Lembro de uma vez falarmos sobre frente de batalha, lembro que eu disse que você era um dos que estavam na linha de frente, no que você me convocou: você também! Acho que não mesmo. Estou inteiro numa guerra por mais humanidade, mais Vida, mais genuinidade, mas estou ainda ensaiando meus primeiros passos no campo de batalha. Engraçado, pensar nisso me lembra da minha infância e meus jogos de tabuleiro, “Combate” em especial. Uma das peças era a bomba. Ela era imóvel, não se mexia como as outras peças, mas quem a convocasse da equipe adversária para o enfrentamento explodia. Somente o cabo armeiro (valor 3 numa escala de 1 a 10) poderia desarma-la. Estou entre a bomba e o cabo armeiro, fixo o suficiente para causar uma explosão e refinando uma habilidade muito específica de atuação. Quem são os inimigos, palavra tão em vigor nessa nossa atual guerra mundial? Eles não são as pessoas, muito menos seus atos, por mais reprováveis que sejam em nome da Vida. Meus inimigos são as ideologias, as máscaras culturais que aprendemos a vestir (e colamos nelas) por imposição de nossos medos e carências, inseguranças advindas de nossa necessidade de amor, tão reveladoras de nossa fragilidade humana. Brigo contra essa poeira vertiginosa que se chama ideologia social, cultura em seu sentido opressor e vigilante, travo minha batalha penosa comigo, tentando me soltar dessas iscas, desses convites. Vou parar por aqui, meu olho esquerdo dói, minha maior luta é sempre travada no silêncio, nas sombras do ninjitsu. André, você e MArcília quês estão trabalhando com as organizações já ouviram falar do livro “Click”? De Faith Popcorn e Lys Marigold, estudo decorrente de uma pesquisa sobre a produtividade das empresas e a questão dos usuários-clientes da internet. Sentei-me algumas horas na siciliano e fiquei de boca aberta com essa pesquisa. Acho que tem tudo haver com plataformas virtuais gerenciais, novo campo de atualização das grandes organizações. Basicamente mostra como um levantamento de dados feitos através da internet pode ser preciso na definição de uma clientela específica de determinadas organizações. Facinante esta pesquisa sobre a fronteira usuário/cliente. Dré, em relação a internet, me lembrei do Rogers no A Pessoa do Futuro, abre aspas: “Têm uma profunda desconfiança em relação à ciência e à tecnologia atuais, usadas para conquistar o mundo da natureza e controlar o mundo humano”. Uma coisa é constatarmos essa realidade virtual, outra é colarmos nela e queremos entender seus efeitos e desdobramentos. Concordo plenamente com você, mas não me interesso tão profundamente pelo tema, sou de um tempo antigo e primitivo, meio selvagem, que embora não saiba eu hoje como viveria sem essas marcas virtuais, ainda as olho com desconfiança profunda e um certo distanciamento. Elas nos facilitam realmente muitas pontes inter-humanas via inter-net. Mas a preço de que? Em nome do que? A serviço de que estilo de vida? Obviamente é inaceitável para mim, cinéfilo de carteirinha, que tu não tenha assistido Wall-e!! Tu já viu né? hehua

    Para lembrar: http://www.youtube.com/watch?v=geplBr2fcZc

    Entendo que você não está falando disso tudo a partir de um lugar de valor, mas dentro da veia pragmática mesmo. Concordo plenamente. Mas como cristão me distancio um pouco do pragmatismo, devido a um sentido “profético” (verbete do Dicionário de Espiritualidade, sentido histórico e não metafísico do termo) que determinadas experiências tem para mim. Acho que essa experiência de novos acoplamentos organísmicos trata-se, de fato, de um novo “Portal” dentro da história do desenvolvimento humano. Comparável à invenção da roda, ao domínio do fogo? Exagerado demais? Não sei. Mas a coisa está aí pra quem quiser captar. Lembro de uma série de matérias no Fantástico da fabulosa Regina Casé (excelente fabulista ela!) sobre uma “ruma” de reportagens sobre a intersecção internet-favela. A coisa é forte aqui no Brasil viu! Essa teia organísmica virtual. Talvez com esse advento tecnológico o termo “virtual” precisa ser reconsiderado em seu sentido de imagem-imaginário, de experiência e de interação, abandonando-se idéias do senso comum de irreal, distante, outro plano etc. O que eu penso em termos organismicos disso tudo é que embora os sentidos físicos-biológicos que corriqueiramente encontramos ancorados na estrutura da organicidade, os tais sentidos humanos (diga-se de passagem a organicidade não se limita a esse aparato sensível), ganham um novo anteparo com a revolução da internet. Talvez se sinta, se escute, se pense, se cheire e se prove de uma maneira diferente no virtual, isso se nos esforçarmos a partir dessa experiência a um contato profundo com o que isso repercurte em nosso organismo. Num outro plano parece continuar tratando-se do virtual enquanto imagem visual e sonora mediado por uma tela de computador. Será? O próprio sentido de teia, e mais fascinante ainda, o de hipertexto e hipermídia*, conspiram para que essa experiência virtual ancore coisas que ainda não alcançamos. Se isso é bom ou ruim, não cabe a um pragmatista afirmar. Embora em termos biótipos, estar sentado diante de um computador portando tais experiências durante 4 horas diárias não deixa de ser sem efeitos a nossa constituição física. Novamente me vem a Pixar e seu Wall-e.

    * Contexto histórico e reflexões sobre hipertextos, hipermídia e sua
    influência na cultura e no ensino do Século XXI: http://www.cinted.ufrgs.br/renote/mar2004/artigos/10-contexto_historico.pdf
    Artigo bem legal de professores da Federal do Rio Grande do Sul

    Nossa, a espiritualidade virtual é algo incrível! Continuo me sentindo velho, estando dentro dessa geração. Me parece que os ritos espirituais não deixam de estarem ancorados na internet, mas há um ritmo organísmico que “se perde” ou se situa claramente em outro campo ao se tratar do “ritual” (Eliade, M. O sagrado e o Profano. Um dos livros mais fantásticos que li na minha vida, fenomenologia fiel e simbolismo contundente do que é o âmbito experiencial religioso no humano. Qualquer ataque à religião, após a leitura desse livro, dentro de um ponto de vista experiencial e pragmático, torna-se infundado, por em nome de uma reflexão ideológica). Lembrando desse livro fico pensando que espacialidade e territorialidade é essa, o virtual? O livro completo para download: http://www.scribd.com/doc/3010983/O-Sagrado-e-o-Profano-Mircea-Eliade-ptbr

    André, dúvida teórica: Ideal de Eu é uma categoria da Incongruência? E se esse Ideal convergir com a atualização, se ele for real enquanto percebido e real enquanto experiência? Já as condições de valia entendo como categoria da Incongruência por seu sentido de condicional. Mas o Ideal é sempre princípio de Incongruência? Talvez no sentido de que Ideal seja o que não esteja, por seu caráter mesmo de ideal, disponível ao organismo? E se o Ideal tiver um caráter experiencial? (A fé, em alguns casos específicos que desafiam a ciência, talvez seja um Ideal experienciável, ainda que um ideal). Vejo também que as condições de valia são totalmente reais e não irreais ou surreais na experiência. A questão para mim está que essa “realidade” valorativa obstrui, tranca ou impede um fluxo experiencial, uma liberdade experiencial, em nome de uma percepção real da experiência, todavia esta percepção é parcial, fragmentada e não inteira, o que não quer dizer que essa percepção seja deformada, irreal. Ela apenas está atrelada a aspectos muito singulares-pontuais de determinada experiência. Falo isso porque não acho ilusório, ou menos real, para determinado cliente, o fato de estarem colados a determinadas condições de valia. Lembro que discuti algo parecido com o Yuri num email quando eu falava de Foucault. Yuri falava de algo a respeito de que Poder, cultura e política não tem realidade em si. O que concordei perfeitamente. Mas isso não quer dizer que essas categorias inexistem da experiência humana, até porque são sustentadas por meio da experiência humana, por mais abstratas que essas categorias tendem a conduzir determinado comportamentos, e nisso sim está seu caráter de ilusão. Mas num nível experiencial, alcançável ou não pelo cliente em suas porções inter-determinantes, essas condições tem uma força estúpida de realidade “psicodinâmica”, enfim, de experiência também. Se não tivesse esse “valor” experiencial, já que entendemos na ACP esses movimentos de colagem para além de um condicionamento de repertórios ou internalização pura e exclusiva, seria extremamente mais simples uma senhora separar-se de um marido que a espanca. Não gosto muito dos termos deformação, subcepção, ilusão (confesso também que preciso estudar mais sobre isso) pois me parecem convergir de fora do cliente dentro de um fluxo experiencial, a não ser que ele mesmo, cliente, nomeie, simbolize e mais, experiencie, essas condições de valia a partir de si mesmo. Não importa para mim num primeiro plano se a queixa do cliente está colada ou não a determinada condição de valia, ou a determinado ideal que não corresponde à realidade. Importa para mim obter marcas do que seja isso para esse cliente, do que é essa atmosfera, não faz sentido para mim, particularmente, possibilitar que ele se “arranque” dessa “circunstanciação”. Seja ideal ou seja condição de valia, por mais que tais fatores sejam substâncias importantíssimas definidas por Rogers na Incongruência, eu não posso como terapeuta destaca-los e arranca-los como folhas secas do florescimento atualizante do cliente. Eles são parte reais desse cliente específico, são partes reais desse Self, quer obstruam ou não os fluxos experienciais.

    O Amor... o amor... eu silencio sobre ele! Não alcanço e não é para ser alcançado em palavras para mim.

    O Second Life para mim é a tradução, numa planilha menor, da experiência maior que se chama internet. Eu não tenho o menor interesse em me aprofundar sobre isso, engraçado, mas tenho interesse em lhe ouvir falando sobre isso. Não faz sentido pra mim o Second Life, faz mais sentido a Inter-net, entende? Achoq eu o ponto de partida, em relação a perda ou não de dados, é que não se tratam apenas de redes informacionais, não é isso? Se for, circunscreve o caráter experiencial ao vetor informação, e sabemos que é mais do que isso. Second Life sem o suporte humano? Impressionante e “apocalíptico” pra minha mente cultural formatada pelo filme Matrix. Inteligência artificial? Artificial em que sentido se movimenta porções e expressões da realidade e da vida?

    Meus focos de estudos em ACP, desde o início desse meu percurso, se dão sempre numa interface clínica-psicoterapia-psicoterapêutico-terapia-espiritualidade. Por isso tenho essa “compulsão” em te ler André, porque você me leva para vôos em campos os quais eu não opto por estar inscrito, a não ser a partir do momento em que sento na cadeira e me aventuro numa viagem organísmica pela Internet com você!

    Essa vertigem deu-me fome, vou almoçar...

    Um abraço grande...

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  2. André, eu tava pensando, ultimamente teus textos tem tido um efeito muito significativo em mim. Antes eles entravam e eu absorvia as "nov-idades". Agora eles meio que, após a abertura inicial, e no trecho da jornada pessoal que me encontro, eles são um exercício constante de refinamento da minha experiência com a ACP, o humanismo e o pragmatismo, fora as experiências pessoais. Vendo as últimas postagens, o que eu discordo e o que eu concordo contigo (na verdade no que eu me situo e localizo e no que eu não trafego), me senti como se estivesse refinando minha prática pessoal. Era como se seus textos antes fossem meu norte, um lugar para se alcançar e chegar, agora eles me funcionam como balizadores pra saber o que é meu e o que é seu, e o que trocamos disso. Parece que somente há bem pouco tempo eu me perceba já tendo me soltado no abismo formativo-experiencial, há bem pouco tempo me vejo dando os primeiros vôos de águia-sem-mãe. Muito significativo isso pra mim. Cadê nossos amigos militantes mencionados nos textos? Cadê vocês gentes? (gritando...!!!)

    ;)

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  3. Hahaha... Não sei se há gentes por aqui. Isso é uma incógnita para mim: por minha experiência escreve para a terra dos Humanos, inteira, como se a minha escrita não estivesse fundada em uma língua-cultura específica. (E, talvez, de alguma maneira, o fato de eu escrever e experienciar dessa forma, alcance e impacte os organismos e a vida, dentro de mim e de tudo que está vinculado a ela e a mim como parte da vida). Li suas reações e gostei, mais ainda, da sua liberdade para saber o que é seu e o que é meu, sem que isso exija, de você, uma superficialidade na apreensão do que é meu. Me senti, as always, respeitado pela sua leitura de corpo-inteiro, porém, dessa vez, mais do que um senso de admiração pela dedicação às minhas linhas, também me senti mais inteiro, na medida em que uma parte maior da sua inteireza também compareceu. Grata foi a surpresa, e, não menos significativa, reconhecer, nessa experiência pobre da virtualidade - um blog - que é possível, talvez, haver um compromisso à si e à sua experiência pessoal, sem que isso descarte a organicidade e a complexidade terceira, expressa na vida de um outro - nesse caso, em relação a mim. Restaram-me os ecos... longos ecos... dizendo que a experiência da relação e do encontro, desse nosso encontro, por exemplo, traz-me uma beleza rara, de podermos ser o que sejamos, juntos, sem que nada de mim ou nada de você, precise ser omitido ou decantado, pelo medo ou suposição de ameaça, eventuais e arbitrários, que algo meu possa ameaçar ou destituir algo seu, e vice-versa. Mais do que um sentimento de confiança e partilha, é um sentimento de abertura, disponibilidade para viver com o outro, um sentimento de cooperação, de solidariedade, de não fragmentação.

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