quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Experiência #003

(Felizmente, hoje, amanheci ligeiramente melhor -- menos tontura, menor labirintite. Marquei neurologista, na segunda, dia 9 de março, e otorrino, no dia 4. Veremos o que ambos irão prescrever! Ontem, também, foi dia de psicoterapia... eventualmente, a melhora é uma convergência desses fatores, que inclui tudo isso, toda essa movimentação, e, sobretudo, algumas benzisses da amiga Dondon Feitosa).

Ontem a noite, madrugada cintilante de idéias indo e vindo, numa conversa amistosa com Marcília (a Sra. Mar), a questão dos Organismos e da facilitação de campos de expansão organísmica voltaram à tona - se é que, em algum momento, saíram da nossa atenção. Eu acho que, hoje, vou escrever pouco - tenho um outro texto para lapidar, referente à conferência de amanhã à noite, na Acadêmica. Será pouca a minha escrita, mas vou tratar de um ponto nevrálgico, ponto de vulnerabilidades, quando se trabalha numa perspectiva Organísmica. Vamos, então, pedrinhas, passo-a-passo:

1) Uma justificativa que, até então, entendemos como a mais plausível para referenciar e validar qualquer estratégia de manejo, por exemplo, de grupos humanos complexos, enquanto um Organismo ou sistema único, é que a vida é mais sábia e suas ferramentas para automanutenção de si mesma são mais sofisticadas, incríveis, imprevisíveis e imponderáveis que as nossas. Isso é muito importante de compreendermos: se estamos, de fato, tentando somar esforços para que um determinado fenômeno venha a desenvolver-se de tal modo, e que seja capaz de expressar seus potenciais latentes de mútua vitalidade e dinamismo, se o nosso objetivo é o de compartilhar esforços para que um dado fenômeno transforme-se em um processo organísmico e manifeste a força de combate e recriação, característica da vida... tal convergência de suportes técnicos e atutidinais, exatamente pelo nível de dificuldade implícita, justifica-se, apenas (?), na constação que um "tecido vivo" tem maiores probabilidades de resistir e reinventar-se, manter-se e autoregular-se como dinâmica viva e própria, do que qualquer modulação cognitivamente serializada de funcionamentos. Se estamos, por exemplo, falando de instituições e processos que são muito importantes para nós (instituições educacionais, empresariais?)... então, impregna-las de organicidade pode ser um desafio justificável, talvez (?), se realmente acreditarmos que faremos de tudo para mante-las "vivas". Para que elas estejam, vivas, no futuro... então, número ZERO: elas vão precisar de vida! Parece óbvio, mas, às vezes, dada essa "força" própria da vida, também não é tão fácil entender o que significa dizer que os organismos são portadores de uma sabedoria difusa e própria. Se, por alguma razão, ainda acreditamos que o funcionamento organísmico deve ser tolhido, controlado, monitorado e manipulado de tal modo, a reduzir incertezas e independências, então, permuta-se a sustentabilidade de um sistema aberto pela previsibilidade de um sistema fechado. O Organismo é, pois, sempre um sistema aberto, um sistema de apostas maiores na vida - e não nas "certezas" dos nossos temores. Parece-me uma escolha!? Mergulhar na vida é aceitar que, nem sempre, os caminhos serão os "nossos" - muito embora, serão vida, serão parte do que também somos. Será um sistema, fundamentalmente, onde um lado da vida resolve acreditar na sua própria natureza como membro comum de processos no universo, vindo a confiar, aceitar e integrar essa natureza que o(a) constitui, a ponto de estender a sua atitude facilitadora pessoal a tudo mais que ressoe com a vida que dele(a) também faz parte - ainda que uma parte percebida como "distante" ou completamente relegada.

2) SE... foi possível reconhecer que essa dinâmica de funcionamento do Organismo, pela natureza mesma de abertura e complementaridades, de ressonâncias com uma porção maior dos processos e mudanças da vida (em vez de um sistema fechado, cujo maquinário baseia-se em protocolos rígidos de uma certa moral particularizada)... então, uma vez isso sendo possível, parece óbvio entender que: o Organismo não existe para justificar ou servir propósito outro que não sua própria expressão singularizada da vida. Ok, um pouco mais claros: a vida não precisa existir para servir como utensílio, apêndice ou explicação humana. Se o humano virá a atribuir sentido, OU NÃO, se virá a aproximar-se, OU NÃO, as diferentes expressões da vida não surgem, não se manifestam, não se diferenciam, dentro de um esquema que busca satisfazer às necessidades humanas [
Mesmo na personalidade humana, determinados atributos e maestrias são diferenciadas na consciência e isso não significa dizer que, por estarem diferenciados, serão ou estarão, necessariamente, disponíveis ao cotidiano (um exemplo, no caso do indivíduo com um enorme potencial criativo e intuitivo que, dada uma multiplicidade de fatores, nunca efetivou-se]. Não estar incluso dentro dessa lógica Renascentista e Antropocêntrica (onde o homem é a medida de todas as coisas), da liberdade Moderna do sujeito que se AUTOdefine e que proclama o sentido de todas as demais coisas com as quais se relaciona... é óbvio que essa não pode ser a matriz do funcionamento Organísmico. Uma árvore não surge para dar sombra ao homem, não surge para absorver o gás carbônico do homem. A Gaia não expressa seus processos para satisfazer as necessidades e fantasias do homem. A vida não solicita permissão, não consulta a experiência humana, no curso de suas expressões de entropia ou sintropia. Logo, existe uma fase, na aproximação ou facilitação do Organismo, em que nós, humanos, haveremos de saber lidar com a tensão de não termos nossos medos e incertezas, ancestrais, no comando do processo, onde nossas perguntas... talvez... não encontrariam as respostas esperadas... Onde a vida reassume seu lugar e sua direção própria. Às vezes, e não raramente, é muito difícil, experiencialmente, suportar, no corpo, tantas marcas e tantas diferenciações das expressões e processos da vida, muitos dos quais (aparentemente) não tem nada a ver conosco, outros que somos parte sem compreender por inteiro etc. Diferentes movimentos, entre partes diversas da vida, estão interagindo e mutuamente se modificando, e o universo, por inteiro, se ajusta, se realoca, se movimenta, se inteira de novas aquisições, com percas e nascimentos, novas passagens possibilitam novos fluxos que permitem novos caminhos que oportunizam novos aprendizados... uma teia vida! E minimamente... mínimamente humana. Difícil, talvez.

3) Então, de acordo com essa Teoria, Centrar-se no Organismo (da Pessoa singular, ou de um coletivo de Pessoas... melhor dizendo, dos processos que ocorrem numa Pessoa, ou nos processos que trespassam um coletivo de pessoas...), é centrar-se na vida... é centrar-se nos fluxos da vida. Propósito e finalidade são, apenas, aspectos mínimos da expressão total da vida do tipo humana. Porém, mesmo nos humanos, mesmo quando estamos a considerar um Organismo onde participam vários humanos (um grupo, uma fábrica, uma sala de aula etc), existem, alí, também, a influência e o alcance de processos que constituem o Organismo, e não são apenas humanos. De acordo com Rogers, processos de Atualização são características de TODAS as expressões orgânicas da vida, enquanto que os processos de Formatividade são características de TODAS as expressões inorgânicas da vida. [PS: orgânico, inorgânico e "a-orgânico", por exemplo, a noosfera citada no trabalho de Polanyi] Quer isso dizer, então, que não é preciso haver "sentido" e "propósito", ou "finalidade" humanas, para que haja Atualização e Formatividade. Quer, também, se dizer que, ao se facilitar Atualização, está facilitando-se, por exemplo, uma dimensão da vida, que, se está presente no humano, está também presente, por exemplo, no reino vegetal e no reino animal que, eventualmente, façam parte de um mesmo conjunto ou Organismo. Estou querendo sublinhar que não facilita Organicidade (de uma pessoa, ou de um grupo de pessoas), munido de uma finalidade estrita e humanamente imediatista e utilistarista. Se facilita Organicidade no intuito de aproximar porções vivas no Universo, facilitar ressonâncias, alianças, potenciais latentes e mútuos de encontro e crescimento. Facilitar mais expansão, cooperação, ligações. Observemos, ainda, que os Processos Regulatórios de Ciclagem da Água, por exemplo, são ciclos BioGeoQuímicos, extremamente sofisticados, eficientes, precisos, e que não dependem, nos seus processos regulatórios, de qualquer senso de intencionalidade ou subjetividade humana. Quando se fala que a experiência humana também dispõe de uma capacidade de AutoRegulação, não se está descaracterizando o potencial, de outras expressões e manifestações da vida, que também se AutoRegularem. Autoregulação não é privilégio da consciência humana (talvez, os símbolos sejam - mas não são com os símbolos que trabalhamos na ACP). Podemos, talvez, discutir quais são algumas... das especificidades que observamos nos ciclos de regulação, atualização e formatividade humana, entretanto, não podemos desconsiderar que estes mesmos ciclos, fluxos e processos são co-dependentes de todos os demais ciclos e funcionamentos da vida, considerando que a vida e seus fluxos estão, constantemente, em interconexão, transmutação e transitoriedade. Exatamente porquanto se trate de uma Teoria N-Ã-O Antropocêntrica, ao mencionarmos intervenções capazes de facilitar processos de AutoRegulação, Atualização e Formatividade, estamos, basicamente, aludindo processos que facilitem maior complexidade, interrelação, fluxo, ressonâncias, mudança, crescimento, transitoridade e consonâncias entre os muitos sistemas. É uma relação de ajuda e intervenção terapêutica que nos inscreve como uma experiência viva.

4) Contextualizado esses aspectos, então, vislumbra-se que o Organismo possa fomentar processos de duas naturezas: favoráveis ou agressivos ao funcionamento do conjunto de suas relacionabilidades, em outras palavras, congruentes ou incongruentes às suas possibilidades concretas de manejo. Estas relações que um dado Organismo participa, eventualmente, podem atentar contra esse funcionamento global em rede de vida. Trata-se, fundamentalmente, de uma adesão de uma parcela isolada do Organismo para vir a manifestar certa e tão somente aquela atividade específica, ainda que a eventualidade de tal expressão incorra em fragmentação de um número significativo de redes de suporte e interrelacionabilidades com o Organismo como um todo. É uma adesão, em outras palavras, que elege suspender o grau de abertura e fluxo do Organismo, para torna-lo um sistema fechado que orbita em torno de eixos particulares. A natureza desses eixos de restrição impostos ao funcionamento irão caracterizar InCongruências ao nível da AutoRegulação, ou da Atualização, ou da Formatividade - em algumas vezes, de colapso generalizado, aos três níveis do Organismo, concomitantemente. Ao contrário, a Teoria informa que o Organismo tenciona ao crescimento na medida em que os três eixos estejam alinhados, de modo que o Organismo constitua-se como um CAMPO de mediação complexa para fluxos, interações e processos da vida. Diria-se como uma atitude ou intervenção incongruente aquela que obsta ou cessa uma possibilidade ou um conjunto de fluxos e interações organísmicas, interações que favoreçam a interdinâmica do sistema como um todo, das interações e trocas entre todos os seus organismos.

Uma próxima discussão é a que distingue essa análise para o Organismo de um indivíduo particular, e o conjunto de relações que ele traz para sua constituição, manutenção, regulação, crescimento etc... e o Organismo de vários indivíduos reúnidos, e a mediação do conjunto de fatores e variáveis implicadas.

Thich Nhat Hahn: "... o ritmo do meu coração é o nascimento e a morte de tudo que está vivo..." (do poema "Please, Call Me By My True Names")
. Sugestão de vídeo, que poderia se chamar Organismo-Mundo...?
http://video.google.com/videoplay?docid=-1167355072466299984

Um comentário:

  1. Ual!!! Tudo se movimenta, tudo é tão dinâmico e complexo. Embora no não controle exista pairando uma simplicidade tão genuina que a minha mente humana capta apenas fragmentinhos vivos da Vida. Senti em mim um gito nesse texto: deixem a Vida se manifestar e pronto! Talvez sua labirintite e tontura sejam desses fluxos carnavalescos no Brasil. Acredito que quanto mais organicidade em jogo menos tempo e espaço entram numa relação de causação que impacta nossos corpos enquanto expressão também da vida. Fortaleza estava estranha nesse carnaval. Lindamente estranha. Fez frio, o por-do-sol estava laranja, a noite branca, a cidade calma e vazia. As árvores respiraram melhor. Ou se prepararam melhor? O tempo está arrastando várias porções humanas, e a spessoas simplesmente não percebem. Redemoinhos no céu, noite clara, bú da coruja: estamos vivos também ok?!!! Meus amigos brincam sobre a "ondona", e eu não sei em mim o que constatar, a não ser afirmar: assim seja, não pertence a mim, e isso não é abstentismo do tipo, não cabe a mim, não posso fazer nada... Não é isso. Misericórdia, foram minhas sintonias sutis nesse carnaval. Talvez o impacto organísmico não seja lá tão impactante assim. Mas algo dentro de mim diz que a 'ondona' não será apenas externa, essa divisão não existe. Mas quanto mais fixo é uma raiz daninha, mais força e impacto se faz necessário para arranca-la. Fico pensando, a ondona já está aqui e faz tempo, a gente que pensa que nos acostumamos com ela. Acho que a Vida não vai dar a escolha humana optar por se realinhar ou não, mesmoq ue nós pensemos que estamos escolhendo, penso mais numa convocação. Meu corpo tem estremecido, ontem monsieur P. Weill brincou comigo, com uma lata de Vick e minha mente pairando sobre espiritualidade. Não alcanço sentido, e seu texto me mostrou que não preciso fundamentalmente dele, apenas contemplo. Partes em mim se rasgam, tentam sair corpo a fora, estremecem, se arrepiam, conversam comigo. Quanta brutalidade separar bicho de natureza, homem de organismo vivo. Rachamos nas fendas da história humana, e como diz minha amiga Don don, pobre daqueles que virarão poeira da história. Ainda não é isso, os símbolos faltam aos montes. Uuuuuuuuuuuuuiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuummmmmmmmmmmmmmmmm

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