quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Praças: De Alexandria à Fortaleza

Saibamos qual é o lado da praça, dos muitos lados, das muitas praças, em que estamos...

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ECOS DA FILÓSOFA HIPÁTIA
André Feitosa

A experiência cabe em toda e qualquer marginalidade que se pretenda encerrar: aquela dos religiosos, inclusive. Todavia, a religião e as suas direções/divindades não constituem elementos imprescindíveis ou requisitos compulsórios na Ciência, no Estado e no Debate Público Democrático. Considerando que os exercícios biológicos da empatia e da vinculação, além da manifestação cultural da ética e do respeito não são domínios privativos de nenhuma crença religiosa ou código espiritual, a verticalidade na capacidade humana para expressar e reinventar seus potenciais é um campo de objetivos em mutação histórica e paradigmática. Sendo legítima a experiência da espiritualidade, assim como as são, por exemplo, experiências estéticas, lúdicas e imaginativas, o fato de pertencerem aos domínios das faculdades e das instituições humanas não decorre a obrigação pressuposta que as relações sociais e políticas estejam referendadas por quaisquer das suas concepções mais particulares. A prevalência de discursos hegemônicos nesse condão de interesses segregadores, ou a constatação simplificada das adesões majoritárias, não cessa a inviabilidade contemporânea de pretensões anacrônicas à dignidade humana nas conquistas do nosso século. A realidade da experiência sensível e lúdica, assim como o imediato da experiência mística e transcendente, dentre outras facetas (mágicas, míticas, imaginativas, corpo-vivenciais etc) do humano diverso que somos, não são demandas capitulares aos mecanismos de funcionamento e efeitos que se desdobram no Estado e na Ciência. O Estado avança com a potência inexplorada que os homens vislumbram em suas artes e artefatos – veios substituídos e atalhos de outrora esquecidos; novos riscos e fronteiras. Que não cesse a fruição identificada nos caminhos do passado, mas que o Estado não obste a poética indecifrável no momento e seus peregrinos. O estatuto de laicidade é uma conquista histórica que resguarda, fundamentalmente, o próprio direito de manutenção desses compromissos bizarro-dogmáticos em diversos coletivos pré-Modernos, religiosos sobretudo – de outra forma apresentados, padeceriam na ameaça de perfeita e iminente extinção em face da inadequação aos tempos da diferença e da alteridade. As garantias individuais são plurais, atinentes às necessidades de cada um e uma, mas a Ciência é laica e o Estado, por definição, é tão somente laico: a propósito dessa narrativa universalizante, seja o deus ou os seus correlatos, qualquer tentativa de monopólio metafórico com pretensões vinculantes no agir público, é ingerência que volatiliza o Estado na afirmação do encontro e no enfraquecimento do diálogo em permuta à imposição do arbítrio-temor que nos silencia. Como Humanista, a experiência humana cabe em toda e qualquer marginalidade que se pretenda encerrar: inclusive, considerar que não há um/o deus para o braço do Estado, com interdições e sanções que possam adotar novas matrizes de regulação que superem e inovem às referências anteriores; considerar que não há um/o deus para a Ciência, para intervenções que alcancem objetivos mais amplos, minimizando os circuitos de repetição e exclusão; que amplifiquem novas paixões, e, certamente, possibilitam novas tensões-reflexões. O movimento que favorece o sonho com o paraíso, também oscila na contra-força da mesma balança cósmica: ousar transgredir horizontes do sentir e do conhecer que extrapolem as convenções na alma do mundo. Assim nos lembra, salve, salve, de Alexandria para Fortaleza, a filósofa Sandra Helana de Souza ("O triunfo da religião?"*, Opinião - Jornal OPOVO, 22/02).

* Texto original da filósofa Sandra Helena de Souza disponível em:
http://www.opovo.com.br/app/opovo/opiniao/2012/02/22/noticiasjornalopiniao,2788396/o-triunfo-da-religiao.shtml